Uma viúva impedida de "apenas" chorar pela morte do marido. Precisa pensar em dinheiro. E nem é pela falta dele, o que certamente seria mais dramático. É pelo excesso. Ele trabalhou a vida inteira para formar um patrimônio. Conseguiu. Fez grandes investimentos, comprou imóveis. Mas faleceu sem ter organizado os bens conquistados. E ela se viu, de repente, sem o companheiro e com um problema nas mãos: o que fazer com aqueles recursos que ela nunca tinha tomado conhecimento? Em que investir? Como gerir e tentar perpetuar os rendimentos, fazer com que a riqueza se multiplique? Como escolher a quem confiar essa tarefa?
É para minimizar esse tipo de transtorno que têm crescido os serviços de planejamento para a sucessão patrimonial. A ideia de se preparar para a própria morte ou uma doença grave pode soar como mórbida. Mas é vista hoje em dia como sinal de prudência, pelo bem dos herdeiros e do crescimento do próprio patrimônio. Para tentar minimizar problemas de gestão como na história (real) que abre esta reportagem é que boa parte dos 19 novos milionários que o Brasil ganha por dia - de acordo com a revista americana "Forbes" - está procurando assessoria para organizar um planejamento sucessório. Ele serve também para evitar brigas pela divisão de bens entre herdeiros, reduzir os longos processos de inventários e até mesmo para diminuir custos tributários.
Alguns dos instrumentos mais utilizados nesses processos são os fundos exclusivos e os de previdência. Neste último caso, há um entendimento claro de que eles não entram no inventário - caso tanto do Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) quanto do Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) -, mas, para uma carteira exclusiva ter o mesmo tratamento, suas cotas precisam ser doadas em vida. Do contrário, terão que ser inventariadas. A interpretação sobre a previdência é mais simples porque os produtos são registrados em nome de uma empresa, e não da pessoa física, sendo tratados, em termos de registro, como um seguro. Em caso de morte, o beneficiário é conhecido antecipadamente.
Outra vantagem dos portfólios de previdência para fins sucessórios é o fato de não incidir o imposto de transmissão, que é estadual. No caso de fundos de investimento tradicionais, o imposto é cobrado - em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, a alíquota é de 4% sobre o total dos bens. O advogado e especialista em planejamento sucessório Flávio Leoni Siqueira lembra, no entanto, que a divisão dos beneficiários dos planos de previdência tem sempre que atender à lei, bastante prescritiva quanto a herdeiros como filhos e cônjuges. Em resumo: ninguém pode ser prejudicado.
No caso dos fundos exclusivos, são muito utilizados no planejamento sucessório também por permitirem o direcionamento da gestão dos ativos de forma personalizada, adequando-se aos riscos escolhidos. "É muito positivo para quem quer fazer a gestão da carteira", diz o sócio do escritório Leoni Siqueira.
Seja com perfil de previdência ou não, o fato é que o segmento de fundos fechados continua em expansão. Considerando apenas o universo de "private banking", o volume aplicado em fundos abertos cresceu 18,3% em 12 meses até setembro do ano passado, enquanto os recursos geridos em fundos exclusivos ficou 42,3% maior no intervalo, de acordo com dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) - os mais recentes disponíveis. Nos nove primeiros meses do ano passado, as altas foram de 12% para os fundos abertos e de 29,7% para os exclusivos.
Tanto os fundos de investimento como os de previdência podem ser exclusivos. Mas, para a sucessão patrimonial, o superintendente comercial da Icatu Seguros, Mizael Machado Vaz, lembra que não é necessário criar um fundo próprio, que gera elevados custos fixos com auditoria, taxas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Cetip, além de acabar restrito a quem tem grandes volumes de recursos.
Na Icatu, por exemplo, normalmente não se abre um fundo exclusivo para quem tem menos de R$ 10 milhões. Os produtos de previdência mais utilizados para a sucessão patrimonial são os VGBLs. A opção é ideal porque paga Imposto de Renda (IR) apenas sobre o ganho de capital, no momento do resgate ou no recebimento da renda. Nesse caso, não há o chamado come-cotas, IR cobrado semestralmente nos fundos tradicionais.
Outra estrutura muito utilizada para auxiliar na organização do portfólio é a criação de holdings. Elas permitem o gerenciamento do patrimônio de toda uma família, segundo o especialista em sucessão Marcelo Santoro, sócio do escritório Guimarães, Garcia e Santoro Almeida Advogados.
Ele lembra que o IR para pessoa jurídica vai de 14% a 17% e, no caso de pessoas físicas, chega a 27,5%. Mas as vantagens não se restringem à tributação. "Quando se cria uma holding, protege-se o patrimônio." Santoro lembra que isso pode ser muito importante, por exemplo, em separações, quando o casamento foi realizado sob o regime de comunhão parcial de bens.
A empresa familiar pode tanto ser uma limitada como uma sociedade por ações (S.A.). É por esse tipo de detalhe que ele recomenda ao investidor procurar um advogado da área societária, além de um especialista em direito de família e um tributário. "Já vi casos em que, após o divórcio, a esposa acabou levando mais do que tinha direito porque o advogado dele não entendia de societário", afirma. No caso citado, o cliente fazia parte de uma empresa familiar. Os lucros a que a esposa tinha direito acabaram sendo reinvestidos na companhia, dando a ela uma participação acionária.
Fonte: Valor Economico
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